Liberdade de expressão: direito essencial, mas não absoluto

Vander Loubet*

Um dos pilares fundamentais da nossa democracia, a liberdade de expressão é um direito essencial, consagrado na Constituição Federal, no artigo 5º, inciso IV, que estabelece ser “livre a manifestação do pensamento”. Também está garantida pelo inciso IX, que assegura a livre “expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

A liberdade de expressão não é apenas um direito individual. É uma garantia coletiva. É o oxigênio da democracia. Permite o debate de ideias, garante o controle social sobre o poder e assegura que diferentes vozes sejam ouvidas. Sem ela, não existe um verdadeiro regime democrático.

Essa liberdade fundamental tem raízes históricas profundas. Nasceu dos ideais iluministas e foi consagrada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, fruto da Revolução Francesa de 1789. Ali se afirmou que “a livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem”.

No Brasil, foi no contexto pós-ditadura que essa liberdade ganhou seu significado mais pungente. Durante 21 anos de regime militar, vivemos sob censura. Jornalistas foram perseguidos, artistas silenciados, cidadãos comuns punidos por suas opiniões. A palavra era constantemente amordaçada.

Nossa Constituição de 1988 nasceu como resposta a esse período sombrio. O constituinte originário quis garantir que nunca mais voltaríamos à censura prévia. Nunca mais o Estado decidiria o que podemos dizer, escrever ou pensar. A liberdade de expressão tornou-se uma cláusula pétrea, um valor inegociável da nossa República.

No entanto, nenhum direito é absoluto. Mesmo a liberdade de expressão encontra limites necessários em uma sociedade democrática. A própria Constituição estabelece contornos.

O primeiro deles é a vedação ao anonimato. Quem se expressa deve assumir a responsabilidade por suas palavras.

Outros limites constitucionais incluem a proteção à honra e à dignidade das pessoas. Não podemos usar a liberdade de expressão para caluniar, difamar ou injuriar terceiros.

A proteção contra discursos de ódio também é um limite legítimo. Expressões que incitem violência, racismo ou discriminação não encontram abrigo no guarda-chuva constitucional da liberdade.

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendimento nesse sentido. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.815 e na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 130, o STF estabeleceu o equilíbrio necessário entre a liberdade de expressão e outros direitos fundamentais. Rejeitou a censura prévia, mas manteve a possibilidade de responsabilização posterior por eventuais abusos.

Os desafios atuais à liberdade de expressão são enormes e complexos. Vivemos na era digital. As redes sociais amplificam o alcance da palavra. Uma opinião pode alcançar milhões em segundos. Essa nova realidade traz oportunidades, mas também riscos.

A desinformação se propaga com velocidade inédita. Discursos extremistas ganham palco. Algoritmos criam bolhas que dividem a sociedade. Como equilibrar a livre circulação de ideias com a proteção contra notícias falsas que comprometem a saúde pública ou ameaçam a própria democracia?

Esse é o grande desafio do nosso tempo. Precisamos proteger a liberdade de expressão sem permitir que ela se transforme em arma contra a própria democracia que visa defender. Precisamos combater o discurso de ódio sem criar mecanismos que possam ser usados para calar vozes legítimas.

Cabe a nós, no Legislativo, estabelecer marcos regulatórios adequados. Devemos criar normas que protejam a liberdade sem permitir seu abuso, que coíbam excessos sem impor censura, que responsabilizem sem intimidar.

Esse equilíbrio é delicado e exige debate amplo e plural. Demanda análise técnica e jurídica aprofundada. Requer sensibilidade para as diferentes realidades e opiniões que compõem nossa sociedade diversa.

Encerro esta reflexão reafirmando: a liberdade de expressão é uma conquista histórica irrenunciável. Foi forjada na dor da repressão. Foi consagrada na Constituição Cidadã. É nossa responsabilidade preservá-la para as gerações futuras.

Ao mesmo tempo, precisamos ter a sabedoria de estabelecer seus limites legítimos — limites que não a sufoquem, mas a fortaleçam. Limites que garantam que a palavra livre continue sendo ferramenta de emancipação, e não de opressão. Limites que assegurem que o debate público seja robusto e respeitoso, crítico e construtivo.

Esse é o desafio que nos é imposto. Essa é a tarefa que a História nos confia. Esse é o compromisso que devemos assumir com o Brasil e com sua democracia.

*Deputado federal (PT-MS)

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